quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Como uma deusa

Nosso repórter excepcional convida o roqueiro Serguei, já quase seu assistente oficial, para uma tarde de karaoke com a diva Rosana, em plena Feira de São Cristóvão, no Rio. Na pauta, os segredos dos corpos em eterna transformação de dois sobreviventes do pop-rock nacional.



Imagens de diversas deusas entrelaçavam meus pensamentos. Estou em um quarto de hotel numa tarde calorenta em Copacabana. O telefone toca. Saio do transe. Uma voz diz: “Querido, estou aqui”. Estava conectado. Uma força estranha me desloca. Chego à calçada e não vejo nada, quando, de um pequeno veículo, a voz reaparece: “Venha comigo, Arthur”. Estou lado a lado com a essência de Lakshmi, Parvati, Isis, Iansã e Gaia. Cruzando o Rio rumo à Feira de São Cristóvão, como convidado da Deusa. Nossa conversa era deliciosa. Aquecimento global, beleza, 2012, simulacros políticos, néctares, música e Lilith. Rosana “Como uma Deusa” Fiengo, sorry, Rosana pilota o bólido com destreza.

Sua nobreza é incontestável. Iniciou com 13 anos como cantora na banda Casanova’s. Seu pai, Aldo Fiengo, era líder do Combo, que tocava o mais cascudo rock’n’blues no Brás, em São Paulo. Pergunto sobre o seu retorno, mas a música na rádio interrompe. “Loving you” surge como prova incontestável do revival da Fênix. Número 1 nas FMs do Rio, a música de Minnie Riperton na voz de Rosana é tema da novela global Caras & Bocas.

Com muita cautela pergunto à Deusa sobre o enigma de sua idade. Imagine um simples mortal questionar a longevidade dos deuses... a voz reverbera: “Parei de falar sobre minha idade. Canseeeei! Alguns dizem que tenho 30. Outros malucos, 60. Então tenho a idade que você quiser”.

“O artista merece respeito, e sua arte é a mais pura magia.” Seu rosto me intriga, tento decifrá-lo. Sou fulminado por um olhar que, por pouco, pouco mesmo, não derrete minha consciência. Pergunto à Deusa como é seu dia a dia no Olimpo. Ela solta uma gargalhada e faz troça com este humilde vassalo: “Querido, adoro nadar e fazer musculação. No mínimo três vezes por semana. Sem o corpo não somos nada. A mesma máquina que você ferra hoje, irá precisar amanhã. Não cuidar do corpo é desrespeitar o que Deus te deu”. Ela capta meus pensamentos e emenda: “Danadinho, sei o que você quer”. Não há como enganar uma Deusa. “Quer saber qual a parte de que mais gosto do meu corpo? Minha cintura é divina. Minhas medidas são: 98 de busto, 63 de cintura, 102 de quadril, calço 36 e, ahhhhhhh, uso sutiã meia taça. Tá bom assim?” Sim, Deusa.

Magia negra, sedução
Ela pergunta por que vamos à Feira de São Cristóvão. Não disfarça, Deusa, você sabe. Vamos a um karaoke, com Serguei. “Arthur, Serguei é mito, um ícone. Uma pessoa com um legado maravilhoso. Extrovertido, feliz.” Procuro a calle Paraíba, entre as alamedas da feira. Rosana está animadíssima.

Serguei está espevitado, sacode a juba e nos abraça com fervor. Sou fã de carteirinha desse pansexual. Reverencia a Deusa e declama: “Rosana, você é espetacular. Sua voz é belíssima. Outro dia te escutei cantando ‘Summertime’. Fiquei de cara!”.
Arthur cola rostinho com a Deusa



O karaoke de São Cristóvão é cheio de bossa. A cabine do DJ é recheada de bonecos Falcon. É a primeira vez de Serguei e Rosana juntos. Aquecemos com “Born to be Wild”. Os trinados ecoam pela feira. Serguei dá um parafuso no ar e engata “Dazed Confused”, do Led Zeppelin. Uma série de outras músicas imortais deságua pelas vozes das duas eminências. O karaoke é invadido por uma pequena multidão de devotos, e a plateia vai abaixo com “O amor e o poder”: “Como uma Deusa, você me mantém/ E as coisas que você me diz, me levam além/ Aqui nesse lugar não há rainha ou rei/ Há uma mulher e um homem, trocando sonhos, fora da lei”.

Rosana precisa partir. A saideira é “Move Over”, Janis Joplin. Serguei serpenteia, cai, levanta e se joga. Abraça Rosana com o mesmo carinho que enlaça seu amado jatobá em Saquarema. Acompanho a Deusa até o estacionamento e beijo sua bochecha na despedida. A música na sombra, o ritmo no ar, um animal que ronda, no véu do luar. Eu saio dos seus olhos. Eu rolo pelo chão. Feito um amor que queima, magia negra, sedução.

Matéria da Revista TRIP - Edição 184

10.12.2009 - Texto por Arthur Veríssimo Fotos Daniela Dacorso

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